Fala pessoal!
Faz um tempo que não há novo conteúdo, então que tal um novo capítulo de Ayakashi Hunter?
Boa leitura a todos!
Capítulo 1
Uma Simples Noite de Sábado
PARTE 1
“P-Por
favor...! Senpai, saia comigo!!”
Diante
de seus olhos, sua amiga de colégio se mostrava completamente envergonhada, com
a face em tons escarlates. Ela tinha acabado de se declarar para ele e, em
resposta ao seu silêncio, ela inadvertidamente o chamara para sair.
Seu
nome era Kirishima Haruka. Apesar de ser sua kouhai, era considerada a garota
mais bonita de todo o colégio, de acordo com todos os alunos do sexo masculino.
Ela detinha cabelos castanhos até a altura dos ombros, com uma franja que
descia para os lados, presas por presilhas brancas. Sua face, com traços
delicados, era demasiada vistosa. Sua pele parecia de porcelana e seus lábios
eram levemente pálidos. Em seus belos e redondos olhos caramelados, uma luz
vívida sempre era visível. Realmente, uma garota que poderia ser descrita
simplesmente pela palavra ‘linda’.
“...”
O
garoto a quem ela havia se declarado, por outro lado, era o que poderia ser
chamado de ‘mais um’ em sua sala de aula ~ na verdade, no colégio. Kawamura
Seishi era um garoto demasiado comum, se não fosse pela cor de seus olhos:
prateados. Ele não era excepcionalmente bom nos estudos ou esportes, também não
sendo muito popular com as garotas. Além disso, não tratava ninguém com
distinção, como se todos fossem seus iguais.
Mas,
talvez fora justamente por esta razão que Kirishima tinha se apaixonado por
ele. Afinal, ela estava acostumada a ser tratada quase como uma celebridade por
todos do colégio, sendo então natural a ela que as atitudes de Kawamura se
destacassem, por não colocá-la em um pedestal, como os demais faziam.
“Eu
aprecio seus sentimentos, Kirishima-san...” Ele começou falando, com um tom
suave e dócil em sua voz. Com tal modo de falar, a garota, que acabara de se
declarar, levantou a cabeça, com um brilho intenso no olhar. “... Porém, eu não
posso aceitá-los.”
O
final da frase fora um choque intenso para Kirishima Haruka. Mesmo sem querer,
seus olhos encheram-se de lágrimas e, em seguida, ela saiu correndo, enquanto
era claramente possível ouvir seus gemidos de dor.
Kawamura
abaixou sua cabeça, estalando a língua. Sua expressão era de angústia intensa.
Ele parecia com alguém que acabara de matar uma pessoa por acidente, mas por
não ter escolha. Fechou as mãos em punhos, tremendo-as com a força que estava
colocando. Sentia como se fosse rasgar sua própria mão se continuasse a apertar
~ mas mesmo assim continuou.
Desculpe, Kirishima-san. Eu também
gosto de você, mas não quero envolvê-la no meu
mundo...
Ele
então se sentou, com as costas apoiadas na parede da parte de trás do edifício
dos laboratórios. O dia estava quase no fim, mas para ele, na verdade, estava
apenas começando. Não eram apenas estrelas que vinham com o pôr-do-sol. Outras
coisas também apareciam: Ayakashi.
PARTE 2
Dois
dias depois...
Dentro
do quarto, a luz começava a adentrar o recinto com uma suavidade incrível,
enquanto trazia consigo um calor agradável.
O
quarto, de um tamanho comum de seis tatames, parecia, apesar de seu bom
tamanho, um pouco apertado, devido à confusão de objetos e caixas espalhadas
por sobre ele. Parecia que um furacão havia passado por ali. Mas não era bem
isso. O dono daquele quarto tinha se mudado na noite anterior.
Cansado
e com preguiça ~ a ponto de nem trocar de roupas para dormir ~ Kawamura Seishi tinha
decidido que arrumaria devidamente as coisas em seu quarto quando acordasse.
Contudo,
ele ainda não havia se levantado.
E
o relógio já marcava quase 9 horas.
Certo
que o dia de hoje era um sábado, e ele não tinha quaisquer aulas neste dia,
mas, mesmo assim, o fato de que um adolescente saudável ainda estar dormindo neste
horário indicava que algo estava fora do comum. Certamente, se sua mãe o visse
nesse estado, a primeira coisa que poderia pensar era que ele estaria envolvido
com más influências.
Mas
tal pensamento jamais aconteceria.
Isso
em função de Kawamura Seishi ser órfão.
Sua
mãe havia falecido em um acidente de carro quando ele ainda era muito novo e
seu pai simplesmente desaparecera alguns anos depois.
Ele
vivera só desde então, tendo as despesas custeadas por uma tia. Isso, até
agora.
Por
uma questão de economia, sua tia sugeriu que ele fosse morar junto dela, em sua
casa que, coincidentemente, era muito próxima ao colégio que Kawamura
frequentava: o Colégio Tachibana.
Ele
não fora contra a ideia, obviamente.
Mas,
mesmo assim, ele continuava deitado, aparentemente não se importando.
“Seishi,
se levante.”
A
voz de sua tia vinda do corredor acabou por fazê-lo despertar, finalmente.
Sonolento, ele levantou, esfregando os olhos. Seu quarto estava uma verdadeira
bagunça. Ele bem sabia disso.
“Já
acordei, tia.”
Respondendo
com a voz ainda repleta de vontade de deitar-se novamente, Kawamura ficou de pé
enquanto tirava sua camisa. Decidira que, uma vez que simplesmente havia
deitado na cama e dormido, no dia anterior, tomaria logo um banho antes de
começar a arrumação de seu quarto.
Ahhhh... Eu ainda estou morrendo de
sono... A última noite não foi nada fácil, muito embora não fosse um de alto
nível.
Kawamura
se referia ao seu trabalho.
Não
um trabalho de meio-período comum, como um qualquer que adolescentes de 16 anos
conseguiriam em um posto ou loja de conveniências. Ele se referia ao trabalho
que ele exercia durante as noites, juntamente a outras pessoas por toda Tokyo,
como seguranças da vida, como guarda-costas da humanidade. Ele caçava Ayakashi.
Essa
era a verdadeira razão de seu sono e cansaço.
Embora
para pessoas comuns, como sua tia, ele simplesmente parecesse um aluno
preguiçoso que se mantinha na média, na verdade, isso acontecia pelo fato de
ele não ter tempo extra para dedicar-se aos estudos. Todas as noites,
principalmente após o céu escurecer por completo, em tons de negro, as
atividades mágicas do manto espiritual divagavam. Tais divagações provocavam o
choque entre o mundo humano e o submundo. Esse fenômeno em si causava a
aparição de monstros mágicos, de demônios. Tais criaturas eram chamadas de Ayakashi.
Mesmo
que nem todos os Ayakashi possuíssem
natureza maligna, eles necessitavam de energia mágica para sobreviver e pela
incapacidade de a maioria dos Ayakashi ter de poder absorver a energia mágica
livre no ambiente, eles necessitavam consumi-la de dentro de outros seres. Em
resumo, matavam para viver. Acontece que, embora animais possam sentir a magia,
eles não podem converter o manto espiritual em energia mágica. Os únicos que os
fazem são os humanos. Essa era a maior razão pela qual pessoas como Kawamura
Seishi lutavam: Para proteger a vida de
pessoas.
Contudo,
não eram todos os que caçavam Ayakashi movidos por noções tão nobres quanto
Kawamura. Muitos optavam por seguir essa vida no intuito, muitas vezes, de
sentir os prazeres de uma batalha mortal, em vez de focar na segurança das
pessoas.
“Bem...
Agora, vamos arrumar isto aqui.”
Entretanto,
havia uma forma também de poder impedir os Ayakashi sem matá-los, embora não
fosse algo utilizado por boa parte daqueles que os caçavam: Contrato Shikigami.
Formando
um contrato de subserviência eterna, era possível utilizar o Ayakashi como uma
ferramenta de batalha, algo como uma invocação. Em troca, era cedida
constantemente parte da própria energia mágica para esse Ayakashi que estava sendo
controlado. Contudo, aqueles que faziam isso ~ os Summons ~ eram muito raros, mesmo dentre o mundo mágico, devido a
falta de confiança na natureza dos Ayakashi.
Essa
é a mais pura verdade por trás do mundo em que a maioria dos humanos vivem.
Esta é a verdadeira forma do mundo. Um mundo onde batalhas pela vida e morte
acontecem constantemente, todas as noites, por todo o globo.
Contudo,
nem todos os Ayakashi são fracos a
ponto de apenas saírem durante a noite. É a preferência deles por fortalecer
seus poderes.
Mas...
Existem
Ayakashi fortes, que não se preocupam com tais regras.
...
“Pronto...
Muito melhor agora.”
Olhando
satisfeito para o quarto, uma vez que tinha terminado de arrumá-lo, Kawamura
sorriu alegremente, com as suas mãos enterradas em seu quadril, em uma posição
de conquista.
Uma
vez que já estava próximo ao horário do almoço, desceu para comer algo, muito embora
não sentisse tanta fome quanto julgava ter. Buscou apenas uma grande maçã,
junto das demais frutas que se encontravam em um canto da cozinha. Em seguida,
avisou a sua tia que sairia um pouco e que não precisava esperar por ele para o
jantar.
Sua
nova casa, a casa de sua tia, realmente era muito próxima ao colégio onde
estudava. Mesmo andando em um ritmo lento, não deveria levar nem 5 minutos até
o portão. Necessariamente, apenas 2 esquinas separavam sua nova moradia de onde
estudava.
Mas
ele não estava saindo para ir até o colégio.
Ele
decidiu passar na casa de uma amiga que sabia que morava ali perto, em
Yokohama. Eram apenas algumas ruas mais distante. Nada que realmente chegasse a
cansar um estudante, principalmente um estudante como ele.
Andando
pela rua que passava ao lado do Bukkocho, indo em direção à Kanagawa; era para
lá que Kawamura se dirigia.
Sua
visita não era unicamente para ver essa sua amiga, uma vez que ela estudava
juntamente com ele no Colégio Tachibana. Na realidade, ele tinha alguns
assuntos para resolver com ela. Alguns assuntos específicos, que não poderiam
esperar, mesmo que até o anoitecer.
“Espero
apenas que ela esteja de bom humor... Considerando minha mudança repentina,
pode ser que ela tente me dar algum sermão ou venha reclamar, talvez...”
Ele
falou em um suspiro, coçando seus volumosos cabelos castanhos, que quase
chegavam até a gola de sua camisa, por trás, e eram caídos, embora alguns fios
insistissem em se manter não totalmente abaixados.
Não
demorou muito mais que meia hora para chegar até a residência de sua amiga.
Afinal, ela não era nem muito distante do Parque Imainooka. No momento em que
ia tocar a campainha, ponderou.
Urrgh... Por que eu estou com uma
sensação tão ruim...?
Antes
mesmo que ele voltasse a se mover, um peso veio repentinamente sobre suas
costas, envolvendo-o pelo pescoço.
“SE-I-SHI!!!”
Uma voz feminina soou, claramente zangada.
“H-Hina-nee!?
E-Espere... você está... me... enfor...”
“Eu
sei muito bem o que estou fazendo, seu idiota!!”
Mesmo
com Kawamura se debatendo em seus braços, a garota não parava de enforcá-lo,
obviamente gostando de ver a reação do garoto.
Ela
era Kamiouji Hina, a ‘amiga de infância’ ~ se assim pode-se dizer ~ de
Kawamura. Eles conheceram-se pouco depois de Kawamura tornar-se órfão e
rapidamente ela tomou uma posição de irmã mais velha em relação ao garoto.
Isso, muito embora às vezes ela não agisse desse modo, como, por exemplo,
agora.
“Hina-nee...
Por favor...”
“Pare
de choramingar, seu fracote!! Você sabe muito bem que merece esta punição pelo
que fez!!”
Tentando
libertar-se do enforcamento, Kawamura impulsionou seu corpo para trás, se
agachando, na tentativa de lançar o corpo da sua amiga por sobre si mesmo.
Mesmo assim, não era fácil fazer aquela garota ser lançada, não apenas por ela
ter a mesma estatura que ele. Afinal, em um determinado aspecto, ela era sua
senpai.
Quando
Kawamura já se encontrava sem forças para resistir, Kamiouji finalmente o
soltou, largando o corpo do amigo ao chão. Ela então colocou uma mão na
cintura, enquanto movia seus cabelos brancos como neve, olhando-o com desdém.
Um brilho de satisfação surgiu rapidamente em seus olhos dourados, enquanto
seus finos e pálidos lábios se curvavam em um sorriso.
Ela
então lhe estendeu o braço.
“Você
foi muito irresponsável por se mudar sem avisar absolutamente nada, sabia? Sabe
o trabalho que meu velho teve por causa disso?”
Masculina como sempre...
Kawamura,
melhor do que ninguém, conhecia bem a personalidade da amiga. Embora no colégio
ela se mostrasse como uma garota exemplar, sendo inclusive a segunda estrela do
colégio ~ perdendo unicamente para Kirishima Haruka ~ isso tudo não passava de
uma fachada. Uma fachada que escondia a garota meio-macho que ela realmente
era. Uma garota feroz, ativa, enérgica e que não aceitava qualquer tipo de
desaforo.
Parando
para pensar, talvez, na verdade, ela fosse assim com Kawamura justamente por
ele ser seu ‘otouto’.
“Desculpe,
mas foi a minha tia quem mandou o caminhão de mudanças assim tão
repentinamente. Eu não pude fazer nada. Não houve tempo para avisar.”
“Hmph...
Bem, tanto faz, na verdade. Aliás, o que faz aqui?”
Kawamura
observou sua amiga perguntar-lhe, inclinando a cabeça em curiosidade. Ele então
coçou seus cabelos e fez um olhar sério.
“Bem,
primeiramente, vim avisar da mudança, mas parece que vocês já sabem... No
demais, será que poderíamos conversar em um local mais reservado?”
Kamiouji
respondeu-lhe retornando o mesmo olhar sério. Ela então adiantou-se sobre ele e
sussurrou ao seu ouvido.
“Então,
vamos lá para dentro... Lá poderemos falar sobre isso.”
Kamiouji
então passou à frente de Kawamura, abrindo o portão de entrada da residência.
Enquanto entravam, uma dúvida surgiu à mente de Kawamura.
“Aliás,
Hina-nee, como sabia que eu estava vindo?”
“Err?
Bem...” Ela tossiu, com uma mão fechada diante da própria boca, em seguida,
fazendo uma expressão inocente. “... Um mágico nunca revela seus segredos,
certo?”
Kawamura
não podia evitar olhá-la de modo melancólico pela tentativa falha de sua amiga
em fazer algo engraçado.
PARTE 3
Estavam
sentados no chão de madeira do corredor externo da casa, virados de frente para
um pequeno jardim gramado que havia. Era uma residência perfeitamente ao estilo
oriental, onde a família de Kamiouji Hina viveu por gerações. Como era de se
esperar, as portas eram do mais tradicional estilo antigo, do período Heian.
Kamiouji
Hina encontrava-se encostada lateralmente em uma coluna de madeira, movendo seu
olhar entre o jardim gramado e Kawamura, enquanto com seus braços cruzados.
Kawamura, por outro lado, encontrava-se com os olhos fechados, aproveitando
aquela sensação pacífica que o ambiente proporcionava. Sinceramente, ele sentia
como se essa sensação estivesse fazendo cada uma e todas suas células
recuperarem-se do cansaço em que estavam.
Observando
seu amigo relaxando calmamente, Kamiouji tossiu levemente.
“Então,
Seishi, sobre o que você queria falar, que fez uma expressão tão séria lá
fora?”
“Ah,
sim, desculpe.” Kawamura falou, enquanto sentando de frente para Kamiouji.
“Bem, depois que me mudei, ontem, decidi ainda durante a noite continuar na
minha antiga área, por não ter avisado ninguém. Contudo, quando voltei, pelo
final da madrugada e mais uma vez agora durante o dia, quando vim até aqui...”
Enquanto
falava, a expressão de Kawamura ficava cada vez mais grave e parecia que ele
forçava um pouco sua voz, de modo a manter-se falando calmamente, sem querer
levantar suposições em seus pensamentos. Percebendo isso, Kamiouji interveio,
completando sua frase.
“...
Percebeu uma divagação dentro do manto espiritual, certo?”
Surpreso
com o que Kamiouji dissera, Kawamura acenou, sem palavras.
“Eu
também tenho percebido isso, obviamente. Você não faz parte de nenhum clã
mágico, sendo apenas alguém afiliado à minha família, uma vez que meu velho te
treinou. Sendo assim, você não teve acesso a nenhum dos relatórios dos demais
clãs mágicos.” Kamiouji começou a falar, enquanto olhando para o jardim. Suas
palavras pareciam calmas, mas ao mesmo tempo, traziam uma pressão estranha, que
parecia esmagar tudo.
“O
que esses relatórios diziam exatamente, Hina-nee?”
“Muitas
coisas, na verdade. Mas, para resumir... Parece que Ayakashi estão saindo
durante o dia...”
Quando
ela falou, com um ar de pesar, Kawaura inclinou sua cabeça, em dúvida. Afinal,
sempre fora de conhecimento seu que Ayakashi tinham seus poderes aumentados
durante a noite, devido às mudanças misteriosas dentro do manto espiritual, mas
que, não necessariamente, apareciam apenas neste momento. Sempre houve Ayakashi
que saíam durante o dia.
“Hina-nee...
Não entendo o que isto tem a ver com essa divagação do manto espiritual...”
“Sim,
realmente parece não ter relação, não é? Isso, se não fosse o caso de os Ayakashi que apareceram fossem de ‘Rank C’ ou
menor...”
No
momento em que ela terminou de falar, Kamiouji virou rapidamente seus olhos
para Kawamura.
Assim
como ela esperava, ele estava com os olhos arregalados e a boca entreaberta.
Uma reação compatível com a que ela própria tivera quando leu os relatórios.
Ela então se moveu, desencostando da coluna de madeira, e se aproximando de seu
amigo. Deu um tapa leve no rosto dele, fazendo-o voltar a si, e falou:
“E,
além disso, como se não fosse estranho o suficiente, ele fez uma aparição novamente...”
Ele,
um Ayakashi em especial que tinha uma capacidade estranha para com a energia
mágica. Diferentemente de um Ayakashi qualquer, esse podia canalizar e absorver a energia espiritual diretamente do
manto espiritual.
Chocado,
Kawamura olhou nos olhos de Kamiouji e perguntou.
“O-Onde?”
“América
do Norte. Ou, ao menos, foi o que fomos informados...”
Esse
Ayakashi era considerado de ‘Rank S’, o único até então que precisou de uma
classificação além da ‘mais alta’, o ‘Rank A’. Isso unicamente em decorrência
de sua exclusiva habilidade.
Kamiouji
viu Kawamura tremer silenciosamente, enquanto seus olhos não mostravam nenhuma
emoção evidente, e sua expressão se fazia complexa.
O
silêncio caiu entre eles.
Uma
tensão absurda subiu a atmosfera, como se toda a vida de antes não mais
existisse.
Não
gostando daquela situação, Kamiouji estalou a língua, quase sem fazer barulho,
e decidiu mudar rapidamente de assunto para que Kawamura voltasse ao normal.
“Aliás,
Seishi, todos na escola já ficaram sabendo...” Ela disse, repentinamente,
movendo-se de forma rápida ao lado de seu amigo e cutucando-o com o cotovelo.
“...?”
“A
ídolo da escola, Kirishima Haruka, se declarou para você, huh? Nada mal, nada
mal mesmo...”
“...!!”
Ela
viu Kawamura corar com sua provocação. Boa,
ele caiu. Ela pensou. Então, decidiu continuar.
“Aaaahhh...
Sendo sincera, acho que pode ter sido a decisão correta, se você não quiser ter
todos os garotos do colégio como inimigos... Mas, como garota, acho que você
foi muito cruel...”
“Hina-nee!?
Como você ficou sabendo!?”
Sorrindo
zombeteiramente, Kamiouji cobriu a boca com a mão esquerda, enquanto que com a
direita, gesticulava aleatoriamente. Kawamura parecia estar completamente
dentro dos controles de sua amiga.
“Heeeeh?
Não soube? Parece que alguém viu vocês dois, desde a confissão dela até quando
você a rejeitou... Por sorte, não foi um garoto... Se fosse um, poderiam ter
linchado você por ter magoado ela, mas também o teriam linchado se tivesse aceitado...
Situação complicada, não?”
“A-Alguém
viu...? Não! Mais importante!! Você sabe muito bem a razão pela qual eu a
rejeitei!!”
Quando
Kawamura terminou de falar, Kamiouji o abraçou, enterrando a cabeça de seu
amigo de infância no meio de seu busto. Ela fez isso com muita naturalidade
enquanto falava com uma voz terna.
“Eu
sei muito bem, Seishi. Sei que você sempre gostou dela, desde quando a
conheceu, mas que fez isso para protegê-la... Sua nee-chan está muito orgulhosa
de você...”
“Hina-nee...”
Com
uma voz pesada, Kawamura a abraçou. Sempre que Kamiouji Hina agia deste modo
com ele, fazia-o sentir-se feliz e, ao mesmo tempo, triste. Ele sentia
claramente os sentimentos de sua ‘irmã’, enquanto que, ao mesmo tempo, sentia a
falta de ter recebido tal carinho por parte de seus pais.
Em
um movimento rápido e repentino, Kamiouji afastou Kawamura de seu corpo. Sorrindo,
ela fez uma expressão de quem parecia ter se lembrado de algo.
“Falando
nisso... Como a tia está??”
“Nós
não falamos nisso em nenhum momento... Mas, ela está bem.”
“Ótimo.
Agora que você não mora mais sozinho, meu velho mandou eu lhe entregar uma coisa...
Deixe-me ver...” Ela disse, buscando algo dentro de sua saia. “Ahh! Aqui!”
Ela
estendeu a mão, colocando dois pequenos rolos de pergaminhos nas mãos de
Kawamura.
“São
cópias da barreira que usamos aqui na casa. Isso encobrirá sua casa de qualquer
perturbação espiritual. Assim, Ayakashi não poderão entrar lá. É um pouco mais
fraca que a daqui de casa, mas, para uma residência do tamanho da sua, deve ser
mais que o suficiente.”
“Obrigado,
Hina-nee... Mas, por que dois?”
“Ahh.
O segundo eu que pedi para meu velho fazer. Acredito que você não vá querer que
a Kirishima Haruka se machuque, certo? Se alguém além da garota tiver visto a
cena, não seria bom, entende?”
Kamiouji
viu Kawamura a abraçar com força, agradecendo do fundo do coração. Ele parecia,
agora, muito mais com o Kawamura Seishi que ela conhecia.
“A
propósito, meu velho está em Akiba, devido a um pedido especial... Deve ser
difícil ser um dos Caster mais poderosos do Japão, mas, por isso, ele disse que
seu treino, até que ele volte, estará em minhas mãos. Bem, por hoje,
especialmente, você está liberado. Vá logo colocar estas barreiras antes que
anoiteça.”
“Certo.
Obrigado, de verdade, Hina-nee.”
Com
uma despedida rápida, Kamiouji viu seu amigo de infância correr em direção ao
portão dianteiro da casa, desaparecendo de sua vista.
Será que foi certo eu não comentar
com ele sobre os Ayakashi estarem, aparentemente, trabalhando como se
controlados...?
PARTE 4
Voltando
o caminho inteiro até sua nova casa, Kawamura pensava sobre a conversa que
tivera com sua amiga de infância. Algo parecia errado para ele, como se algumas
partes não se conectassem. Contudo, decidiu pensar nisso depois. A prioridade
agora era instalar corretamente as barreiras.
Parando para pensar... Como eu
colocarei esta barreira na casa da Kirishima-san? Não tem como eu simplesmente
pedir para entrar na casa dela e não posso apenas invadir...
Enquanto
pensava, inconscientemente Kawamura diminuiu o ritmo de seus passos, mostrando
uma expressão desesperada. Sem nem ao menos perceber, ele chegou de volta a sua
casa.
Voltando
a si, entrou silenciosamente e foi até a sala. Sua tia não estava. Então,
retirando um quadro da parede, ele prendeu o pergaminho nas costas do quadro e
colocou-o novamente no lugar.
Era
um pré-requisito para o melhor funcionamento de uma barreira de único talismã:
Ser colocado o mais próximo possível do centro da casa. No caso da casa de
Kamiouji, pelo tamanho absurdamente grande da residência, havia um sistema de
diversas barreiras interligadas, de modo que uma fortalecia a outra. Em base, essa
outra era a mesma coisa, mas o método era outro.
Após
recolocar o quadro no lugar, ele sentiu instantaneamente a expansão da
barreira, de modo que, aos seus sentidos, o manto espiritual parecia mais
estabilizado agora. Uma sensação calorosa percorria seu corpo, de modo a
recobrar-lhe sua energia espiritual. Era o efeito da barreira. Ela ampliava a
estabilidade do manto espiritual, recobrando a energia espiritual e bloqueando
a sistematização de materialização dela, ou, em outras palavras, impedia que
qualquer coisa não humana que possuísse quantia de energia espiritual pudesse
entrar ou aparecer ali dentro.
Uma
vez que a barreira estava estabelecida, era hora do verdadeiro problema: Como
ele colocaria a barreira na casa da Kirishima?
Suspirou
profundamente, sem saber como faria.
Decidiu
então sair logo da casa antes que sua tia aparecesse. Não queria que ela perguntasse
nada sobre o pergaminho que restava em sua mão. Assim, ele novamente saiu
andando pela rua. Desta vez, em direção a Sakuragaoka, mais exatamente, para
próximo do Parque Sakuragaoka Ruokuchi.
...
A
distância era pouco maior do que até a casa de Kamiouji Hina, de modo que
quando se aproximou do Parque Sakuragaoka Ruokuchi restavam pouco mais de 5
horas para o anoitecer.
Kawamura
observava a casa, ao longe, de modo discreto, sem saber o que fazer exatamente
para poder ir até lá. Repetidas vezes, a cena que acontecera dois dias antes
viera a sua cabeça. Ele se torturava por isso mesmo sabendo que fora a escolha
certa. Kirishima Haruka era uma garota demasiadamente gentil e sem nenhuma
aptidão ou afinidade mágica. Assim sendo, ele não poderia envolvê-la em seu
mundo, no mundo daqueles que caçavam Ayakashi ~ no mundo dos Hunter.
Ele
lembrou-se rapidamente de quando começou a gostar de Kirishima Haruka...
Lembrava-se
que fora amor à primeira vista. No ano anterior, quando ele a viu no dia das
provas de admissão, sentiu-se como se estivesse observando uma pintura
maravilhosamente bela. Desde então, não havia uma única vez em que quando a
vira ele não sentisse como se estivesse perdendo o equilíbrio.
Ele
apenas nunca imaginou que ela também sentiria algo por ele, o que o fez ser
pego de surpresa pela carta de amor que recebera dela, dois dias atrás. Era uma
data que ficaria para sempre marcada na mente dele. Um 11 de julho inesquecível
por receber a declaração da garota que gostava e por ter que rejeitá-la, para
protegê-la.
“Ka-Kawamura-kun...?”
Uma
voz repentina o pegou de surpresa.
Aquela
leveza, aquela doçura, aquele tom levemente agudo... Era impossível para ele
não reconhecer de quem era aquela voz. Surpreso, com o rosto pálido, ele
virou-se rapidamente para direção de onde a voz viera.
“Ki-Kirishima-san!?”
Era
ela, a garota de belos e brilhosos cabelos castanhos que chegavam até os
ombros, de olhos caramelados e lábios pálidos, Kirishima Haruka.
Ela
parecia tão surpresa quanto Kawamura, por ele estar próximo de sua casa,
observando-a, mesmo que discretamente. Em condições normais, era suposto uma
garota que se deparasse com tal situação achar que ele fosse um stalker, mas,
talvez devido ao que ela sentia por Kawamura, Kirishima apenas surpreendeu-se,
e inclinou a cabeça, perplexa.
“O
que você está fazendo aqui, Kawamura-kun?”
Suor
frio começou a descer seu rosto e Kawamura não fazia ideia alguma de como
deveria responder. Rapidamente, ele começou a olhar no entorno, procurando um
ponto de fuga, enquanto ponderava.
E agora...!? O que diabos eu devo
falar...? Não tem justificativa eu ficar aqui, espiando sua casa... Ainda mais
após rejeitá-la... Então, o que eu deveria dizer para poder escapar de uma
situação como esta!?
Seus
olhos começaram a girar, enquanto nenhuma ideia lhe vinha à cabeça para se
livrar daquela situação. Então, inconscientemente, sua boca moveu-se...
“N-Na
verdade, eu estou aqui, porque queria poder falar com você...”
Apenas
depois de falar fora que Kawamura se deu conta de suas palavras. Além disso, ao
notar a expressão complexa na face de Kirishima, um misto de alegria, tristeza,
mágoa e medo, ele tremeu silenciosamente.
“T-Tudo
bem... V-Vamos entrar, então...”
A
voz dela soava um pouco forçada, como se fazendo o possível para segurar as
lágrimas, que pareciam querer vir a todo custo.
Kawamura
mordeu os lábios, enquanto baixava sua cabeça, acenando positivamente. Ele
então seguiu Kirishima até dentro da casa dela.
“Com
licença...” Ele disse, em uma voz pesada, ao entrar pelo portão da casa.
“N-Não
se preocupe. Meus pais não estão...”
A
frase realmente era para fazê-lo sentir-se menos nervoso? Era para aliviar a
situação? Era impossível ele realmente conseguir se sentir calmo, ou mesmo
‘alegre’, com a situação em que se encontrava. Isso, pois diante dele estava a
garota que ele gostava. O seu primeiro amor. A mesma pessoa que ele fora
obrigado a rejeitar.
Conduzido
até a sala, ele sentou-se no sofá, enquanto assistia Kirishima sentar-se no
sofá localizado logo em frente.
Quando
pensou em falar qualquer coisa...
“Então...
Kawamura-kun, o que você gostaria de falar?” Ela disse, com uma voz claramente
esperançosa.
...
A
cena se mostrava perfeitamente clara em sua mente, como se estivesse acontecendo
agora mesmo. Ela parada, diante ele, sobre a parca brisa por trás do prédio do
colégio, apertando suas mãos contra seu coração enquanto se declarava. Seu
rosto completamente corado e seus olhos vacilantes.
A
cena tinha feito seu coração palpitar assustadoramente. Nunca que ele poderia
imaginar que aquela cena verdadeiramente aconteceria. Mas ele não estava
sonhando...
Sua
mente ficou em branco. Tudo o que ele mais queria fazer era abraçá-la e lhe
dizer que nada o deixaria mais feliz do que poder estar com ela.
No
entanto...
No
momento exato em que ele estava para dar o primeiro passo em direção a ela, sua
consciência retornou. Momentaneamente, seu coração parou de bater e ele fechou
os olhos, em dor.
A
memória dele a rejeitar, dela sair correndo em prantos, isso havia impactado
muito sua mente, era algo que ele não poderia nunca se redimir...
“Então...
Kawamura-kun, o que você gostaria de falar?”
A
pergunta dela o fez voltar de seus pensamentos, quando estava prestes a falar
algo que nem ele mesmo sabia o que era.
Pela
expressão de pura inocência e esperança na face de Kirishima, era claro para
Kawamura que ele precisava ser sincero sobre o que falar, explicar-lhe o motivo
de não ter aceitado sua declaração, mas excluso é dizer que não poderia revelar
nada sobre o outro mundo para ela.
Ele
suspirou profundamente, tentando acalmar o redemoinho de emoções que se
amontoavam em sua mente. Ergueu o olhar, encontrando-se com os olhos dela.
Aquele
breve momento em que seus olhares se cruzaram levantou uma atmosfera terna
dentro do ambiente.
“Kirishima-san...
Eu sei que o que eu direi não é suficiente para me desculpar pelo que fiz a
você, mas...” Ele disse, mantendo sua voz o mais calma que conseguia. “... Eu
realmente sinto muito por ter rejeitado sua declaração. Ouça bem... não é que
eu não goste de você. Muito pelo contrário, eu diria que nada me faria mais
feliz do que poder estufar o peito em saber que você seria minha
companheira...”
Enquanto
falava, ele notou que o rosto de Kirishima corava com suas palavras, e que ela
cobria a boca com uma das mãos, demonstrando uma alegria imensa em saber disso.
“...
Mas eu acho que ainda não sou maduro o suficiente para poder ter um
relacionamento tão importante. Não quero magoá-la, mas, por enquanto, eu não
posso aceitar sua declaração...”
Kawamura
pensou que esse final poderia fazê-la chorar novamente, e, ao perceber isso,
tentou reparar sua frase para um modo mais brando, mas...
“...
Então, isso significa que você também gosta de mim, certo...?” Ela perguntou,
mas não esperou resposta. “Kawamura-kun, então, se eu esperar até que você se
sinta pronto... Você aceitaria meus sentimentos?”
Verdadeiramente
falando, Kirishima Haruka era uma garota de muita fibra e atitude, mesmo que
apenas em seu coração. Ela se mostrava tímida, mas ao menos em relação daquilo
que ela queria sem abrir mão se mostrava alguém que lutava incessantemente. Um
aspecto dela que talvez ninguém conhecesse, e que estava sendo apresentado em
primeira mão para Kawamura.
Um
sorriso surgiu nos lábios de Kawamura, e, em conformidade, outro surgiu, mesmo
que singelo, nos lábios de Kirishima.
“...”
Ele não conseguiu responder com palavras, mas, inconscientemente, acenou com a
cabeça.
Os
olhos de Kirishima cintilaram e ela pareceu se acalmar completamente. Fora uma
visão deveras relaxante, e Kawamura sentiu uma sensação calorosa.
Entretanto,
parecia que ele tinha esquecido o propósito ao qual viera até a casa da garota,
afinal, o pergaminho ainda repousava em sua mão.
“Aliás...
Kawamura-kun?”
“Sim?”
Ele perguntou, inclinando a cabeça para a expressão de curiosidade no rosto de
Kirishima.
“Bem,
eu estava me perguntando já tem um tempo... O que é isso em sua mão?”
Apenas
quando ela o perguntou fora que a razão a qual viera retornou à sua mente. Ele
inadvertidamente arregalou os olhos, gaguejando, sem saber o que dizer. Seu
rosto empalideceu, e ele rapidamente tentou esconder o pergaminho. Mas já era
tarde demais...
“Seria
algum documento...?”
“Bem...
na verdade... era para... pro... você...” Ele não conseguia, por mais que
tentasse, falar a frase e, verdadeiramente falando, ele não notava que quase
falara uma palavra que poderia fazer Kirishima perguntar mais e mais sobre o
artefato.
“Para
mim...!?” Ela perguntou, com um tom de alegria em sua voz. Poderia ser um mal
entendido, mas, ao menos, parecia ter funcionado.
Em
função disso, Kawamura relaxou sua musculatura.
“Sim.
Eu pensei em lhe oferecer este pergaminho que eu escrevi... Bem, não sei se
você acredita nestas coisas, mas, em umas pesquisas, vi que estas inscrições
trazem boa sorte e proteção para a casa de quem o pendura. Então, decidi lhe
dar um...”
Os
olhos de Kirishima brilharam magnificamente, com o amendoado deles encarando-o
de forma apaixonada. Ele então a entregou, dizendo que, de acordo com a
pesquisa feita, o efeito era aumentado caso pendurado no centro da residência.
Obviamente, ele inventara a história no momento, apenas para escapar da
situação.
Ela
então o pendurou de imediato, sorrindo constantemente.
Logo
depois, ela pediu que Kawamura ficasse, pois prepararia um chá. Não tinha como
ele negar tal gentileza, aceitando amigavelmente sua oferta. Durante mais um
tempo, eles permaneceram conversando, apenas os dois, enquanto o tempo
passava...
PARTE 5
Já
era noite quando se despediram.
Mesmo
que, em fato, Kirishima ainda tivesse sido rejeitada por ele, Kawamura
percebera bem que eles tinham se aproximado um pouco.
Enquanto
ainda estava na casa dela, perguntou-lhe onde ficava o banheiro, isso, não para
realmente usá-lo, mas para mandar uma mensagem, avisando sua amiga de infância,
Kamiouji Hina, que ele se atrasaria para ir junto dela às atividades noturnas.
No momento em que na mensagem ele especificou a causa de seu atraso, a resposta
de sua amiga fora algo completamente diferente do que imaginava.
‘O que quer dizer com isso, seu idiota!?’
era
a resposta que ele esperava, contudo, a que realmente viera fora um simples ‘Tudo bem, não se preocupe com o tempo que
for demorar...’ e, logo abaixo, um emoji estranho de um ursinho branco
dando uma piscadela.
Era
verdade que isso o fez sorrir, achando graça da reação completamente fora da
personagem de sua amiga, mas, ao mesmo tempo, ele sentiu-se grato por isso e
decidiu que retornaria o favor para Kamiouji.
Uma
vez que estava já andando pela rua, Kawamura olhou nos arredores, após dobrar a
esquina, e constatando que não havia ninguém por lá, fechou os olhos por um
breve momento, localizando a energia espiritual de sua amiga. Em seguida,
partiu em disparada, correndo em direção a ela.
As
divagações dentro do manto espiritual estavam mais fortes que durante o dia.
Ele podia sentir claramente. A razão era óbvia: era noite. Apenas esse simples
fato se mostrava como algo terrível para muitas pessoas. Era o momento em que o
manto espiritual divagava mais fortemente, fazendo com que os dois mundos chocassem,
propiciando mais facilmente a aparição de Ayakashi.
No
entanto...
Enquanto
se dirigia para o local onde sentia a energia espiritual de Kamiouji, uma
sensação obscureceu seus sentidos, fazendo-o parar de súpeto. No momento
seguinte, ele saltou, o mais alto que podia, direcionando-se para trás e
entrando em guarda.
Não
demorou mais do que um único segundo após seu salto para que o chão explodisse
repentinamente. Não fora uma explosão forte, contudo, ainda assim, o chão fora
arrebatado.
Droga...! Então temos um aqui,
certo?
Com
uma expressão séria, Kawamura observou a nuvem de poeira que subia no local da
explosão. Uma silhueta esguia se mostrava por dentro da poeira. Era uma
silhueta humanoide, muito embora não lembrasse verdadeiramente um humano. A
figura mais próxima que poderia ser relacionada seria a de um werewolf.
Pela sua energia mágica, ele deve
ser um Rank C, ou talvez um Rank B... Não é algo muito forte, mas preciso ter
cuidado com sua velocidade.
Movendo
cuidadosamente os braços em posição para desembainhar uma lâmina, ele
concentrou sua energia espiritual, canalizando-a através de suas mãos. Em
conformidade, uma estrutura fina e longa, com um tom de um vermelho fosco,
apareceu.
Era
uma katana. Afinal, Kawamura Seishi era um Hunter do tipo de afinidade
espiritual Assault.
Seus
olhos nãos desgrudavam nem um único momento do oponente. Ele sabia pelo que
tinha sido ensinado pelo pai de Kamiouji ~ que fora e ainda era o seu mestre no
ensino das artes mágicas ~ que um Ayakashi semelhante com aquele teria uma
velocidade incrível. Dito isso, um Hunter Assault teria como vencê-lo com mais
facilidade, pois era possível que o Ayakashi cancelasse a utilização de magias,
ou invocações, por exemplo.
O
werewolf tinha mais de dois metros de altura. Seus membros eram magros, quase
esqueléticos, com exceção de suas mãos e pés, largos, desproporcionais com a
largura dos braços e pernas. Pelos só eram visíveis em sua cabeça, costas, mãos
e pés. Sua pele era negra como breu, e seus olhos do mais escarlate fogo do
inferno... Uma verdadeira criatura medonha, que parecia vinda de um livro de
terror.
Vagarosamente,
Kawamura retirou a lâmina de sua katana da bainha. Nela, havia uma inscrição em
sânscrito que, dizia seu mestre, guardava o espírito guardião dela. O som do
aço raspando aço, da katana sendo desembainhada, era angustiante, tanto por ser
um ruído agudo quanto pela demora, em virtude da pouca velocidade nos
movimentos de Kawamura.
No
momento em que a lâmina fora totalmente retirada da bainha, essa última
desapareceu. Mantê-la materializada era um gasto desnecessário de energia
espiritual. A katana, em sua empunhadura mostrava protuberâncias como se fossem
chifres, que se conectavam com a lâmina, dando um aspecto mais rústico e que,
de longe, faziam-na não lembrar a classe de lâmina que ela pertencia ~ uma
Crissaegrim.
Era
possível ver claramente, uma vez que a poeira tinha finalmente dissipado por
completo, vapor quente saindo do bafo da criatura. Ele estava faminto. Necessitado
de energia espiritual. E, diante ele, um suposto alvo fácil, que segurava uma
simples lâmina. Um corpo repleto de energia espiritual, capaz de saciar seu
desejo.
Em
um movimento rápido ~ muito mais que rápido, por melhor dizer ~ o werewolf
investiu sobre Kawamura. Era um ataque certeiro, direcionado à sua cabeça, no
intuito de esmagá-la.
Mas...
“Não
se ache, seu bastardo!”
Com
um movimento rápido, utilizando de sua katana, Kawamura conseguiu interceptar a
mão do Ayakashi, cravando o fio de sua lâmina dentro da carne do werewolf.
Um
uivo estridente foi escutado, ressoando pelo céu da noite. Junto dele, uma meia
mão voava, caindo inerte ao chão. Um espirro de sangue jorrou do Ayakashi,
enquanto Kawamura colocava alguma distância, não muita, entre eles.
A
lâmina da Crissaegrim era incrivelmente afiada, inacreditavelmente leve e
desumanamente veloz. Uma katana perigosa, mesmo para o próprio usuário.
Mas
Kawamura parecia manejá-la com maestria. Prova disso fora sua capacidade de
defender um ataque de alta velocidade de um werewolf, com apenas um único
movimento.
Contudo,
o trabalho não estava terminado...
Mesmo
ferido, o Ayakashi não mostrava sinais de querer fugir para poder encontrar um
alvo mais fraco. Caso o fizesse, e conseguisse, poderia acabar regenerando sua
mão decepada. Mas seu olhar mostrava sua intenção em matar Kawamura.
Aqueles
rubis escarlates, que ficavam em sua cabeça, brilhavam com o ardor de chamas. Chamas
maléficas. Chamas infernais.
O
werewolf investiu outra vez. Contudo, não em um movimento direto como o
primeiro. Ele agora circulava Kawamura, aumentando sua velocidade a cada passo,
rodeando-o em sentido horário.
Na
visão de Kawamura, a velocidade do Ayakashi era tamanha que parecia existir
mais do que um dele.
Certamente, ele é um Rank B. Nenhum
Rank C conseguiria uma velocidade tão grande...
Mesmo
assim, ele se mantinha calmo. Rapidamente, ele olhou de soslaio para as garras
da mão decepada. Pareciam não conter veneno. Isso significava que muito
provavelmente mesmo as presas dele não seriam venenosas.
Menos mal... Ele
pensou enquanto inalava uma grande quantidade de ar e fechava seus olhos.
Segurando
a sua Crissaegrim com a mão direita, ele apoiou a mão esquerda por sobre a
articulação de seu braço direito, concentrando uma grande massa de energia
espiritual em seu braço.
O
momento seguinte não durou nem um segundo sequer...
...
“Kawamura,
você tem uma grande quantidade de energia espiritual. Sendo assim, combinando
com sua katana, que pode desferir golpes velozes, você pode conseguir um poder
destrutivo maior ao colocar a energia espiritual de sua bainha para reforçar
seu braço.”
Durante
seu treino, essas foram as palavras de seu mestre, o pai de Kamiouji Hina.
Como,
no ato de materialização, Kawamura utilizava um de seus braços para
materializar a bainha, e o outro para materializar a lâmina, sua Crissaegrim
tinha, na verdade, apenas metade da energia espiritual que era canalizada no
momento da materialização. Se ele, então, utilizasse a energia espiritual
referente à bainha, e infundisse-a em seu braço de materialização da lâmina,
sem canalizá-la para energia mágica, ele duplicaria todas as características de
sua katana.
E
fora isso que ele passou tanto tempo treinando, até a exaustão: conseguir
dominar tal técnica ensinada por seu mestre.
“Não
posso dizer que será seu trunfo, isso dependerá de você, mas, graças sua
grandiosa quantia de energia espiritual, se tornará de um simples ato em uma
espécie de ‘ás na manga’.”
Kawamura
sempre fizera o melhor para seguir rigorosamente os ensinamentos de seu mestre,
e, em concordância, o resultado esperado não demorou para aparecer...
...
No
momento exato em que o werewolf atacou-o, sua infusão de energia espiritual em
seu próprio braço já tinha acabado e estabilizado.
Fora
um movimento rápido de ambos os lados.
O
Ayakashi desceu com sua outra mão e suas presas em direção a Kawamura, visando
qualquer ponto vital que conseguisse alcançar. Contudo, de um modo
completamente hábil, Kawamura deliberadamente deixou seu braço ser pego pelas
presas do Ayakashi, ao mesmo tempo em que, antes que sua carne fosse perfurada,
ele conseguisse fatiar completamente o inimigo. Quando parou de mover a lâmina,
era visível que as inscrições em sânscrito brilhavam em um tom leve de verde.
Além
de sua energia espiritual, ele havia requerido ajuda do espírito guardião de
sua katana.
O
corpo fatiado do Ayakashi caiu no chão em conformidade com o término de sua
existência. Rapidamente, as partes começaram a dissolver como brasas acesas há
muito tempo, com o pó sendo levado pela brisa.
Ele
tinha facilmente derrotado o inimigo. Indiretamente, ele havia salvado a vida
de pessoas que nem ele conhecia.
Rapidamente
olhou a hora.
O
relógio de seu celular marcava 10:30 PM.
Guardou
novamente o celular, e desmaterializou sua katana, focando novamente em
encontrar onde estava a energia espiritual de sua amiga de infância.
Mais
uma vez, não fora difícil de achar. Contudo, ela parecia mais fraca.
“Huh?”
Uma sensação ruim lhe percorreu a espinha, e Kawamura novamente correu o mais
rápido que conseguia.
...
Sua
amiga de infância encontrava-se caída em um terreno baldio próximo ao viaduto de
cruzamento da Yokohama New Way com a Yokosuka Road. No entorno dela, nenhum
sinal de Ayakashi. Isso o deixou aliviado.
Outra
coisa que o aliviou fora o fato de que Kamiouji não parecia estar ferida, nem
aparentava estar desacordada, apenas respirava pesadamente, exausta.
“Hina-nee...
Você está bem?”
“Ahhh...
Sim, apenas exausta...” Ela disse, abrindo um dos olhos, e sorrindo para o
amigo.
“Para
você estar acabada assim, Hina-nee, era algum Rank A?”
“Não...
Foram seis Rank B, na verdade... Mas eles eram rápidos, e isso me desgastou
espiritualmente.”
Ranks
B rápidos. Ao ouvir estas palavras, Kawamura cerrou os dentes silenciosamente.
A descrição, mesmo que não constasse com as aparências ou tipos, combinavam com
o que ele tinha enfrentado.
Será que aquele fora enviado para
me atrasar, para que a Hina-nee tivesse que lutar sozinha contra os demais?
Não... Não é possível... Mesmo que eles fossem um grupo que caçava junto, não
acho que eles poderiam criar uma estratégia dessas...
Afastando
tais desconfianças, Kawamura ajudou sua amiga de infância a se levantar.
“Vamos,
Hina-nee, deixe-me levá-la para casa...”
Embora
a noite não estivesse acabada, era impossível para Kamiouji Hina continuar por
hora. Kawamura sabia disso e decidiu que essa seria a forma de pagar-lhe o
favor: deixar sua amiga descansar, e fazer todo o trabalho daquela área,
sozinho.
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