A Valquíria Zero - Capítulo VI: Sangue e Neve


Novo capítulo maravilhoso de A Valquíria Zero! Não vou alongar nem nada! 

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Capítulo VI


Partículas violetas preenchiam o céu diurno como se fossem estrelas. Uma visão bela, mas que veio a um custo grande demais. A batalha contra Fafnir havia sido finalizada, e Zero permanecia observando as luzes no céu. Preciso seguir viagem, já passei tempo suficiente aqui pensou, mas ainda restava saber para onde suas coisas foram.

As árvores chacoalhavam devido ao vento que as soprava com força. Os cabelos dourados da valquíria flutuavam ao vento, libertos, como se estivessem vivos.

Zero voltou para inspecionar o local onde acampara, na esperança de encontrar alguma pista que a levasse aos ladrões. Não tinha muita expectativa, mas aparentemente, a sorte permanecia do seu lado, talvez por mais tempo do que gostaria.

Pegadas pequenas, parecidas com as de uma criança seguia mata adentro. Fafnir contara à ela que um anão e um elfo teriam roubado suas coisas, mas as pegadas mostravam-se ser humanas.

Obviamente, sem ter quaisquer outras pistas, decidiu seguir as pequenas e suaves pegadas. Cada passo mais adentro da floresta provava-se ser mais desafiador que o anterior. Não sabia se estava cansada da batalha anterior, ou se a floresta não a queria ali.

Acreditava na segunda opção.

As plantas pareciam fechar os caminhos, fazendo com que Zero precisasse cortá-las. Já não sabia mais por quanto tempo andava, nem por onde. Apenas seguiu as pegadas, que no final, não a levou a lugar nenhum.

Um íngreme monte se erguia em frente à Zero. Era simplesmente um beco sem saída. Zero analisava com calma a enorme parede de pedras e terra que aparecera em seu caminho. Deve haver algo aqui. Pegadas não somem dessa forma, ainda mais de crianças. Pensava, pensava, e pensava mais. A solução nunca chegou.

Por fim, resolveu que aquilo era uma perda de tempo. Obviamente nada seria encontrado em um monte de pedras. Tornou a retornar por onde veio. As folhagens pareciam mais agressivas. Começavam a não só bloquear sua passagem, como se agarrar no corpo da valquíria.

Foi então que percebeu. Aquilo era uma armadilha do elfo. O elfo que Fafnir mencionara anteriormente.

Uma flecha voou de súbito em direção a cabeça de Zero. Como se já estivesse esperando tal ataque, a valquíria desviou-se com tremenda facilidade. Para ela, aquilo não passava de uma simples briga.

Mais flechas seguiram a primeira, dessa vez com uma maior frequência, e mesmo assim, parecia impossível acertá-la, mesmo estando com os movimentos parcialmente restringidos pelas plantas mágicas.

–– Poderíamos parar com este conflito? –– Uma aura vermelha cobriu Zero, e começou a queimar as plantas que a prendiam. –– Se vocês se renderem pacificamente, terei piedade.

–– Como se eu fosse acreditar nisso! –– Um anão aparecera por detrás de um arbusto. Segurava Dainsleif desembainhada.

–– Anão tolo! –– Zero esbravejava, enquanto esquivava dos golpes do anão. –– Tu nunca deverias ter desembainhado esta lâmina.

O anão nem ao menos ligava para o que Zero lhe dizia. Ele apenas enxergava o sangue. Ele queria ver a valquíria sangrar, queria beber seu sangue.

As flechas continuavam vindo. Zero mantinha-se calma e desviava-se com destreza de ambos os inimigos.

Em determinado momento, mais precisamente no momento em que sua paciência havia acabado, segurou uma das flechas que vinha em sua direção. Com a mesma, penetrou o pescoço do anão, que caiu no chão. Sangue jorrava enquanto agonizava, buscando o ar que sabia que nunca mais viria.

–– Tudo bem! Eu me rendo. –– Uma voz feminina vinha de uma das altas árvores que cercava Zero. O elfo, na verdade era uma elfa. Uma criança.

Vestia não mais que um pedaço de linho que lhe cobria o corpo. Já não carregava mais o arco, nem as flechas. Sua pele era negra como a noite, e seus olhos eram vermelho sangue. Não possuía cabelo, e talvez isso fez com que Fafnir a tivesse confundido com um elfo.

–– Uma elfa negra longe de Svartalfheim, e o mais estranho, de baixo do sol. –– Zero ponderava. –– Um tanto estranho não acha, pequena?

–– Sou metade humana. –– a elfa disse, o olhar direcionado aos próprios pés. Tinha medo de olhar Zero nos olhos. –– Minha mãe disse que criei imunidade ao sol.

–– Entretanto não criou imunidade a fazer besteiras. –– Zero pegou Dainsleif que estava no chão, e foi até a pequena elfa, que tremia, quase como se estivesse convulsionando. –– Onde estão minhas coisas, criança?

–– V-Você vai me matar...? –– Pôs-se a chorar. Aquilo era uma exclusividade para Zero. Já viveu demais, e mesmo assim, nunca havia visto um elfo chorar. Zero manteve-se em silêncio. –– Suas coisas estão naquela árvore...

–– Obrigada. –– Sorriu para elfa. Então a levantou pelo pescoço, e com um movimento rápido, cortou o estômago da pequena elfa com Dainsleif.

–– Por... quê...? –– A elfa sussurrava, tentando entender o real motivo por ter sido atacada. Sangue e mais sangue jorrava de sua barriga.

–– Agradeça ao seu amigo tolo ali. Dainsleif precisa de uma vida toda vez que é desembainhada, ou então seu dono é morto. –– Embainhou a espada, assim que largou a elfa no chão. –– Não posso morrer ainda, desculpe, garotinha.

A elfa negra continuou no chão, apenas seguindo Zero com o olhar.

–– Não devia ter ficado tão longe de casa, pequena.

Zero desapareceu, deixando apenas mais uma trilha de morte e sangue.

Apenas mais morte e sangue.

***

Dois dias e incontáveis horas de caminhada haviam se passado. Zero ainda não dormira, se sentia cansada, suas pernas já vacilavam, mas mesmo se tentasse dormir, sabia que não conseguiria.

Matei aquela menina pensava a todo instante. No calor do momento, possuída pelo poder maligno de Dainsleif, assassinou uma criança, sem nem pestanejar. Ao menos essa era desculpa que repetia na sua cabeça.

Talvez eu seja assim. Talvez não seja a espada.

Pensamentos perturbadores, que não a deixavam.

Apesar do cansaço, os dois dias de caminhada não foram em vão. O clima já estava mudando. O frio substituía o calor, e já não se via mais o sol no céu. A escuridão ia engolindo a luz. Percebia que estava chegando em Niflheim.

Quilômetros à frente existiam cadeias de montanhas, geladas. A neve nunca parava em Niflheim, e muito menos a névoa. Não existia dia, apenas a mais sublime escuridão da noite.

Zero lembrava-se de que era proibida de atravessar as montanhas geladas de Niflheim. Jotuns espreitavam cada centímetro do local, e o frio era supostamente, rígido demais para ela–– ou para qualquer um.

A entrada do reino gelado nunca foi muito convidativa. Uma enorme muralha erguia-se diante Zero. Aparentava ter 200 metros de altura, se permitissem que chutasse alto.

O portão era menor em altura do que a muralha. Era completamente feito de gelo. Em frente ao portão, um Jotun, quase maior que o portão, montava guarda.

–– Afaste-se –– O guarda avisou. ––, não és bem-vinda aqui, valquíria.

–– Conte-me uma novidade, jotun. –– Revirou os olhos. –– Não se preocupe, desejo apenas conversar com Skadi.

–– Skadi? –– Riu. Zero agarrou o cabo de Dainsleif. –– Não acho que conseguirá nem ao menos subir estas montanhas. –– Apontou para os degraus da escada que levava ao templo de Skadi. Chamava-se Caminhos do Inverno: milhares, e milhares de degraus, que formavam caminhos extensos e complexos. Muitos tentavam subi-los, mas poucos sequer retornaram. –– Pode tentar se quiser. –– Deu de ombros, convicto de que Zero pereceria nos Caminhos do Inverno.

Ao perceber que teria livre passagem, soltou o cabo da lâmina sanguinária. Mal acreditava que não precisou derramar uma gota de sangue. Embora o sangue poderia me aquecer nesse inverno maldito pensou.

O frio congelava todas as partes do corpo da valquíria. Era como se a neve penetrasse a sua armadura, e perfurasse sua pele como mil navalhas – o que para Zero seria algo mais agradável –, queria uma forma de se aquecer, queria descansar, mas também queria encontrar o fim dos Caminhos do Inverno.

A nevasca tornava-se cada vez mais intensa, e a visibilidade já era nula. Segurava firme o cabo de Dainsleif enquanto subia a escada interminável, esperando um ataque surpresa a qualquer momento.
E pensar que havia dito para Eir que só usaria Dainsleif em casos extremos... quem eu queria enganar?

A medida que continuava subindo, suas pernas iam se tornando mais pesadas. O cansaço a consumia, a neve ia sufocando, e o frio, a queimava.

–– Auuuuuuuu! –– Um uivo. Isso a lembrou de Fenrir, o lobo gigante, filho de Loki. Sempre gostou dele. E ele nunca deu indícios de odiá-la. Uma relação neutra.

Porém, Zero sabia que esse não era o uivo de Fenrir. Poderia ser de um lobo selvagem qualquer, ou de um dos lobos de Skadi. Teria rezado para os deuses para que fosse a segunda opção, caso tivesse tal costume.

Olhou em volta. Não conseguia enxergar nada, a nevasca estava forte demais. Os uivos não paravam, na realidade, ficavam cada vez mais altos. Os lobos estavam se aproximando de sua presa.

Olhos vermelhos agora podiam ser vistos por entre as rajadas de neve, e os uivos tornaram-se rosnados.

–– Acalmem-se, minhas crianças. É apenas uma valquíria perdida. –– Uma voz suave, mas forte, ecoava pelas montanhas geladas. Os rosnados pararam. –– Mostrem à ela o caminho.

Os lobos foram até Zero, e em seguida, incitaram-na a segui-los. Subiram mais e mais degraus, enfrentando a nevasca, que tornava-se ainda mais forte. Não demorou muito até que chegassem no fim dos Caminhos do Inverno.

A deusa da neve, do inverno, e da caça, esperava Zero, em frente a seu templo, sua casa. Tinha a aparência de uma jovem humana de 25 anos. Seus olhos azuis combinavam com seus cabelos de mesma cor. Vestia uma blusa de couro, com um decote generoso, e um manto de pele de urso. Calçava uma bota que ia até metade de sua canela, e logo acima do joelho, terminava sua saia, justa ao corpo. Em seu pescoço, um cordão repleto de dentes das mais variadas espécies.

–– Siga-me, valquíria. Creio que deseja conversar.

Seguiram para o interior do templo.

–– O que veio fazer aqui, criança? –– Perguntou enquanto iam avançando por entre os corredores frios da rainha do inverno. –– Niflheim é escuro e cheio de terrores. Já deve ter ouvido histórias.

–– Não ligo para fábulas. Preciso de fogo.

–– Se quer fogo, vá para Muspelheim, criança.

O mundo primordial do fogo era, e é, o principal inimigo de Niflheim. Seus povos estiveram em guerra desde quando Zero podia se lembrar. Um comentário sobre fogo para uma das principais líderes do mundo congelado talvez não tenha sido inteligente.

Chegaram em uma pequena sala. Uma mesa com duas cadeiras, uma de frente para outra, se localizava no meio. As cadeiras, a mesa, e até mesmo as paredes eram feitas de gelo.

Tudo nesse maldito mundo é feito de gelo?

–– Sente-se. –– Fez um gesto para Zero.

Zero sentou, e nunca agradeceu tanto por isso. Suas pernas finalmente podiam relaxar, nem que fosse por alguns instantes.

–– Ando recebendo muitas visitas ultimamente. –– Skadi soltou seu cinto, e colocou uma de suas adagas sobre a mesa. Descansou os braços na mesa. –– Visitas demais.

–– Não estou aqui para visita-la. –– Disse Zero, olhando para a adaga na mesa. Uma bela arma, embora fosse feita de gelo. Ficou imaginando se derreteria em Muspelheim.

–– É mesmo? –– Passava o dedo indicador na lâmina. –– O que veio fazer aqui então, valquíria?

–– Preciso que me leve até os portões de Helheim.

–– Não há motivo algum que me faça levá-la até lá. –– Respondeu, cruzando os braços. Seus volumosos seios eram pressionados por seus braços. –– Além disso, não tenho tempo para isso.
Zero inclinou-se para frente, apoiando os braços na mesa.

–– Estou em uma missão de extrema importância, você sabe disso, Skadi.

–– E...?

–– Por que me trouxe até aqui? Se não queria me ajudar, porque disse à Heimdall que os caminhos de Niflheim estavam tranquilos?

–– Não se pode mais comentar sobre o próprio local onde se mora? –– Perguntou, fazendo gestos com a mão direita. Era clara a sua impaciência diante as perguntas de Zero. –– Além do mais, não falei nada para Heimdall, ele simplesmente ouve tudo que acontece no universo.

A valquíria manteve-se em silencio. Sabia que o argumento de Skadi era válido, Heimdall realmente ouvia tudo e todos no universo. Talvez ele simplesmente tenha ouvido um desabafo de Skadi sobre Niflheim.

–– Estou brincando com você, valquíria. –– Zero manteve-se apática. –– É mesmo, esqueci que vocês valquírias são seres sem emoção alguma. Acho que vou dizer a Odin que lhes deem um pouco de senso de humor.

–– Não estou com muita paciência, muito menos tempo, para ficar de brincadeiras com você, Rainha do Inverno. –– Bateu com o punho na mesa.

No exato momento que Zero encostou com o punho na mesa gelada, uma lamina penetrou sua mão, prendendo-a na mesa. Era a faca que Skadi segurava.

–– Esperava que fosse mais educada, Zero. –– Torcia a faca no punho fechado da valquíria. O sangue escorria e transformava o branco puro em vermelho.

–– E eu esperava que você não fosse tão descuidada, Skadi.
Por uma fração de segundo, Skadi estava confusa. Não demorou muito para perceber o erro que tinha cometido.

–– Belo truque, querida valquíria. –– riu.

Duas valquírias agora estavam na sala, ou melhor, duas Zero. Uma, permanecia sentada em frente a Skadi, com a faca rasgando a carne da sua mão direita. Já a outra, mantinha uma faca no pescoço da deusa da neve.

–– Não é um truque. –– A valquíria sentada na cadeira passou a sumir lentamente. –– A que está sentada na sua frente é uma imagem de momentos atrás. Tudo que precisei fazer foi ser rápida o suficiente para criar essa miragem.

–– Interessante. –– Subitamente, uma flecha penetra as costas da valquíria, atravessando seu peito. –– Mas você não esperava que eu me tornaria sua refém, esperava?

Zero olhou para a direção de origem da flecha. Skadi estava no fundo da sala, segurando um arco de caça.

–– Mas o que...? –– A deusa do inverno que sentava na cadeira se transformou em um clone de gelo sem vida. Zero não conseguia esconder sua frustração enquanto tentava se manter consciente. Havia algo estranho com aquela flecha.

Veneno? Não, é tranquilizante. Pensou, enquanto sua visão começava a falhar. Poucos segundos depois, seus músculos relaxaram, fazendo com que caísse no chão.

–– Sabe, tudo isso poderia ter acontecido de forma pacífica... –– Agachou-se ao lado de Zero. –– Pena que não gosto da forma pacífica.

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